quinta-feira, 29 de julho de 2010

A fé de uns e outros - Por Martha Medeiros

A fé de uns e de Outros

Apoio que as pessoas se manifestem publicamente contra a violência urbana,
contra os altos impostos que não são revertidos em benefícios sociais,
contra a corrupção, contra a injustiça, contra o descaso com o meio
ambiente, enfim, contra tudo o que prejudica o desenvolvimento da sociedade
e o bem-estar pessoal de cada um. No entanto, tenho dificuldade de entender
a mobilização, geralmente furiosa, contra escolhas particulares que não
afetam em nada a vida de ninguém, a não ser aos diretamente envolvidos, caso
da legalização do casamento gay, que acaba de ser aprovado na Argentina.

Se dois homens ou duas mulheres desejam viver amparados por todos os
direitos civis que um casal hétero dispõe, em que isso atrapalha a minha
vida ou a sua? Estarão eles matando, roubando, praticando algum crime? No
caso de poderem adotar crianças, seria mais saudável elas serem criadas em
orfanatos do que num lar afetivo? Ou será que se está temendo que a
legalização seja um estímulo para os indecisos? Ora, a homossexualidade faz
parte da natureza humana, não é um passatempo, um modismo. É um fato:
algumas pessoas se sentem atraídas – e se apaixonam – por parceiros do mesmo
sexo. Acontece desde que o mundo é mundo. E se por acaso um filho ou neto
nosso tiver essa mesma inclinação, é preferível que ele cresça numa
sociedade que não o estigmatize. Ou é lenda que queremos o melhor para
nossos filhos?

No entanto, o que a mim parece lógico, não passa de um pântano para grande
parcela da sociedade, principalmente para os católicos praticantes. Entendo
e respeito o incômodo que sentem com a situação, que é contrária às
diretrizes do Senhor, mas na minha santa inocência, ainda acredito que
religião deveria servir apenas para promover o amor e a paz de espírito. Se
for para promover a culpa e decretar que quem é diferente deve arder no fogo
do inferno, então que conforto é esse que a religião promete? Não quero a
vida eterna ao custo de subjugar quem nunca me fez mal. Prefiro vida com
prazo delimitado, porém vivida em harmonia.

Sei que sou uma desastrada em tocar num assunto que deixa meio mundo
alterado. Daqui a cinco minutos minha caixa de e-mails estará lotada de
agressões, mas me concedam o direito ao idealismo, que estou tentando
transmitir com a maior doçura possível: não há nada que faça com que a
homossexualidade desapareça como um passe de mágica, ela é inerente a
diversos seres humanos e um dia será aceita sem tanto conflito. Só por cima
do seu cadáver? Será por cima do cadáver de todos nós, tenha certeza. Claro
que ninguém precisa ser conivente com o que lhe choca, mas é mais produtivo
batalhar pela erradicação do que torna nossa vida ruim, do que se sentir
ameaçado por um preconceito, que é algo tão abstrato.

Pode rir, mas às vezes acho que acredito mais em Deus do que muito cristão.

*Texto de MARTHA MEDEIROS*